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Tópico Aberto originalmente por 901
Desta vez é mesmo na sala de visitas da marca, que de certeza não é por acaso e de certeza que foi motivo de discussão, o primeiro carro com que o visitante se depara é o Typ 64.
E agora?
O que é que a casa Porsche quer dizer com isto?
Que mensagem quererá passar para dentro?
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[justify:2qg8qpvi]Este tema do Typ 64 é parecido com o de uma novela mexicana. A Porsche no que toca à sua história pinta o quadro consoante os seus interesses que, diga-se, nunca foram lúdicos, mas meramente económicos. O critério para definição do primeiro Porsche, tem naturalmente que ser demarcado pela própria Porsche. E isto porque academicamente, o primeiro Porsche deverá ser aquele que nasceu com intenção de ser marca “Porsche” e não qualquer outra. Ter sido feito por Ferdinand Porsche ou pelo Ferry Porsche, não transforma um carro num Porsche. Isto parece-me inquestionável. Na minha opinião, o critério de definição do primeiro Porsche deveria ser um critério objectivo e não subjectivo. Deveria ser um critério formal e não material. Quero com isto dizer que a decisão de qualificação de um automóvel como “o primeiro Porsche” não deveria estar sujeita à vontade de uma pessoa ou grupo de pessoas, neste caso a casa Porsche. Mas a realidade é que está. E porquê? Porque os carros estavam registados pelo nome do construtor e não por uma marca em si. Todos sabemos que até 1931, Ferdinand Porsche fazia carros noutras empresas. Logo, estes nunca poderiam ser considerados “Porsche”. Apartir de 1931, Ferdinand Porsche cria a sua própria empresa, a “
Porsche Konstruktionsburo fur Motoren-Fahrzeug-Luftfahrzeug und Wasserfahrzeugbau” que se vai transformar na “
Dr. Ing.h.c.F.Porsche G.m.b.H." e posteriormente na "
Dr. Ing.h.c.F.Porsche K.G.".
Agora pergunta-se? Os automóveis construídos por estas empresas de Ferdinand Porsche, poderiam ser considerados Porsche? A resposta parece evidente: não. Desde logo porque os diferentes Typ's (projectos) que a empresa desenvolvia eram comissionados por terceiros. Para ser um Porsche, o projecto de Ferdinand Porsche teria que ser elaborado com esse exacto propósito: o de levar o próprio nome “Porsche”.
Até agora esse mérito coube ao Type 356, nomeadamente ao protótipo roadster, conhecido pelo n.º 1. No entanto é curioso que em nenhum documento do carro, vem lá referido que é um Porsche. Em qualquer dos vários documentos que integraram o “
Einzelgenehmigung Bescheid” (o conjunto de documentação entregues às autoridades para aprovação do protótipo) apenas vem referido a empresa que o construiu (que até não é nenhuma das referidas anteriormente) a "
Porsche Konstruktionen Ges. m.b.H. Gmund, Karten", e o automóvel em si, o PRETENSO 1.º PORSCHE, vem designado apenas como
“Sport 356/1”.
Perante esta realidade, qual deverá ser então o critério para definição do primeiro Porsche? Afastada a origem documental, parece-me razoável que tal seja aferido através de factos históricos da marca, ou seja: o primeiro Porsche terá sido o que primeiro foi apresentado como tal, o primeiro a ser projectado e concebido para esse fim, o primeiro a ostentar o nome “Porsche”. O primeiro que nasceu como projecto próprio para o nome “Porsche”. E o Typ 64 vai falhar todos estes requisitos daí que nunca poderá aspirar ao cognome de "O Primeiro". Mas, por razões externas à empresa, a “porca vai torcer o rabo”. Em primeiro lugar, convém dizer que, muito convenientemente, a Porsche tentou apagar todo o seu passado ligado ao terceiro Reich. Daí que tenha deixado de comemorar os aniversários da empresa, contados desde os anos 30, e tenha passado a encarar o ano de 1948 como o ano zero. E o primeiro Porsche a levar o nome “Porsche” foi efectivamente o 356/1. Convém esclarecer que o Type 64 é 10 anos mais recente, e nunca nasceu com o intuito de ser um “Porsche”. Ao invés, nasceu basicamente um Volkswagen, modelo Aerocoupe, baseado no VW Typ 60 e com nítido intuito de promoção da empresa Volkswagen e, provavelmente, como uma espécie (NÃO ASSUMIDA) de “tubo de ensaio” do futuro primeiro automóvel Porsche. Mas nunca poderá ser um verdadeiro Porsche. Aliás, em boa verdade o Typ 64 até veio emprestado de um Projecto fracassado de um streamliner da Auto-Union e é claramente um produto Hitleriano. O carro foi criado para competir na corrida Berlim-Roma como propósito de grangear fama para a Volkswagen. Não tem por isso nada a ver com a Porsche, apesar de terem sido apenas eles a usufruirem dos carros, já que a corrida nunca se realizou. No entanto, a confusão estalou por causa do Type 64 de 1938 aparecer com as letras “Porsche” colocadas, facto que terá induzido em erro algumas das pessoas ligadas ao meio e que começaram a questionar se não seria o Type 64, efectivamente o primeiro Porsche, até porque o 356 deriva claramente dos seus genes. A verdade é que todos o 3 Types 64 nasceram sem qualquer referência à Porsche. Mas até poderia ter acontecido. Aliás, Ferry fez tudo para tentar salvar os originais, porventura, porque já então, em plena guerra, ele queria preservar os carros para futuro, talvez mesmo dando-os como sendo os primeiros. Os 3 exemplares foram sempre escondidos para escapar à guerra, mas em vão. Um foi destruído por um alto dirigente da KDF. Outro foi capturado pelos soldados americanos que o serraram para imitar um Corvette e acabou também todo destruído. O único que sobreviveu foi vendido a um dos maiores amigos da família, Otto Mathé e é o célebre “T2222”. Ou seja, o único espécime original não se encontra nas mãos da Casa Porsche. A Porsche ficou sem o aerocoupé e agarrou-se ao Protótipo do 356 para o “canonizar” como 1.º Porsche, o que em bom rigor, até é o que está correcto, porque o Type 64 nunca foi produzido para levar a ensignia “Porsche”. Mas, para mal da Porsche, o T2222 apareceu mesmo com as letras “Porsche” colocadas, naquele que deverá ter sido a maior gaffe de Ferry quando em 1949 o carro foi parar às mãos de Otto (mão, já que ele era maneta). E, tal pormenor foi um erro crasso e completamente grosseiro, já que aquele automóvel nunca deveria ostentar no capôt, as letras “Porsche” pois nasceu 10 anos antes da invenção das primeiras letras “Porsche”. E nisto não há volta a dar: antes de 1948 não existiram as célebres letrinhas soltas a dizer “P-O-R-S-C-H-E”. Uma fonte que eu não posso revelar (não é de cá do país) garantiu-me que o Otto Mathé, antes de Ferry morrer, levou o T2222 a Zuffenhausen para o oferecer à casa Porsche e foi impedido de entrar nas instalações. É evidente que eu não posso confirmar a veracidade disto, mas acredito. Até porque Mathé estará inocente nesta confusão e não terá sido ele o causador, como se chegou a pensar.
Eu tenho “algumas” dúvidas quanto à autenticidade do 356/1. Isto é, será que a Casa Porsche tem algum dos carros pioneiros originais? Quanto ao Type 64 não. E quanto ao 356/1? Uma coisa é certa e respondendo às perguntas que lanças e que eu destaquei acima, na minha opinião, a Porsche fez uma figura muito triste agora aquando a criação do novo Museu. E só veio contribuir para mais polémica. São tiros nos pés, atrás de tiros nos pés. E tiros de canhão. O objectivo foi claramente o de tentar arranjar uma novidade. A Porsche queria algo para surpreender e tiveram a (infeliz) ideia de apresentar aquela coisa patética que é um pedaço de alumínio réplica incompleta de um Typ 64. E o resultado não podia ser mais ridículo: deram o destaque principal do Museu a essa peça falsa, colocaram-lhe ainda por cima as letras “Porsche” que é a maior heresia cometida pela empresa até hoje. E, como se não bastasse, relegaram o suposto n.º 1, o 356/1 para um lugar muito pouco condizente com o seu estatuto de primeiro Porsche. Está lo meio dos outros como se fosse mais um. Lamentável. E o mais incrível é que as pessoas que tomam estas decisões devem ser pagas a preço de ouro. É completamente absurdo o destaque que dão àquele bocado de réplica do typ 64, quando o verdadeiro está coberto com um paninho numa pequena garagem particular. É caso para dizer que têm o que merecem. Por causa de uma péssima decisão de Marketing a Porsche enterrou-se ainda mais na sua credibilidade e alimentou ela própria a polémica e a desconfiança para com as suas relíquias. Se eles tivessem tomates e quisessem surpreender, tinham comprado aos Russos o único tanque Maus, o maior da história (dinheiro para isso não lhes falta) e teriam no Museu um ícone da história da Porsche que, só por si, me faria deslocar a Estugarda.[/justify:2qg8qpvi]
Fotografia do pormenor do Typ 64 com as letras de 1948 criadas para o Typ 356/1. As únicas que foram feitas à mão separadamente e colocadas uma a uma. São as únicas originais da época. Parecem-me que só estas letras poderiam ter o valor de um Carrera GT:
Foto da reprodução (muito fajuta por ser extremamente perfeita) das actuais letras que estão no 356/1 colocadas em 2008. Até então, a Porsche nem sequer se dava ao trabalho de as reproduzir separadas, colocando as do 356 "normal" que estavam unidas por uma linha na base: